CONTRA A LAICÍSSIMA TRINDADE QUE NOS SUPERGOVERNA
Se os meus resistentes leitores pudessem imaginar quanto custa exprimir, quinze em quinze dias, nas páginas deste jornal, aquilo que penso ser a minha perspectiva da verdade, compreenderiam o preço que temos de pagar para continuarmos a não pertencer aos rebanhos da esquerda cultural e da direita louvaminheira.
Não me refiro ao ostracismo, sempre inevitável em quem é desalinhadamente excêntrico, mas, sobretudo, às ordens directas de assassinato moral, muitas vezes confessadas pelos próprios executantes, quando eles têm a coragem de se revoltar contra os que os mandaram e confessam todo o processo que, por enquanto, não revelarei, porque ainda tenho força para continuar a denunciar a trama.
Quem, nos meandros deste reino cadaveroso, quiser pertencer ao grupo dos que, para a direita instalada, não estão "em linha com o sentido da história" e que, para as esquerdas politicamente correctas, não estão de acordo com os ditames emanados pelas pranchas da laicíssima trindade senatorial que manipula a rede dos intelectuários desta pequena casa lusitana, corre o risco de ser vítima de alguns psicopatas que continuam a dominar o poder em Portugal e a conjugar o verbo "sanear", numa voz activa que rima com "odiar".
Infelizmente, o problema não está apenas nalguns dos homenzinhos que nos governam e na muita gentalha que os serve, para poder servir-se. O problema maior está nesses manipuladores da falsa inteligência que, apesar de cantarolarem convicções, tanto não têm ideias como até já não conseguem exprimir um sonho.
Esses tais, afinal, secaram. Perderam as raízes vivas que os deviam ligar às correntes profundas que dão sentido a um povo. Estagnaram na verborreia que os notabilizou como actores de jogatanas políticas intestinas, não apenas em congressos e conciliábulos partidários, mas sobretudo em gabinetes alcatifados e salões de luxo dos serões da gente pretensamente fina.
Por isso é que, face ao deserto de ideias em que vamos mentalmente definhando, proliferam os especialistas em jogos de bastidores e em "public relations" com o quarto poder, especialmente com os donos do capital que o gere o dito e com os fabricantes das agendas mediáticas que fazem o "management" da percepção.
Muitos deles não passam de papagaios de papel colorido que apenas permanecem enquanto durar o vento que os fez ascender ao horizonte da visibilidade e não se quebrarem os cordéis dos interesses que os manipulam.
Julgo que, para compreendermos a crise que nos sitia por dentro, temos que ver além do nosso "pouvoir sur scènes", e descobrir quem, na verdade, são os efectivos "donos do poder". Temos que afastar a poeira desses intermediários mediáticos e desses "intelectuários", desses mistos de intelectual com serventuário, que, parecendo pensar, apenas dejectam as vulgatas do sistema que lhes dá a sobrevida.
Porque pensar, para esses seres semoventes, equivale a entoar uma espécie de música celestial que só parece capaz de influenciar os ficcionados habitantes dos sem lugar e do sem tempo, ditos utopia e ucronia. Porque, aqui e agora, o dinheiro que compra o poder, que torna a inteligência subserviente e que dobra as vontades é, afinal, o único valor que resta.
Nesta ditadura do "statu quo", onde, segundo as vigentes regras do jogo, ganham aqueles que podem escolher os árbitros, há sempre os que sabem que a bola escolhida para o sorteio foi a que previamente colocaram no congelador, para que as aparências do sorteio continuem a iludir os que julgam que tudo é aleatório.
Acontece apenas que a revolta dos homens livres pode transformar o desencanto em esperança e vencer a ineficácia daqueles que dizem seguir esse "fanatismo da abstracção", a que dão o nome de revolução, comunismo e Bloco de Esquerda.
O cúmulo do ridículo tem acontecido com os bailados que federam a laicíssima trindade da nossa gerontocracia, para utilizar os nomes invocados recentemente pelo Grão-Mestre do Grande Oriente Lusitano, para a regeneração de Portugal.
Basta notar a presente imaginação cenarista que envolve os candidatos a candidatos à presidência, onde o Deus-Pai que federa a grande irmandade do elogio mútuo apenas se vai divertindo, com pôr o filho à pancada com o espírito santo e os falsos profetas a fazerem longas análises políticas.
Todas essas prosas típicas das governantas do sistema parecem rivalizar com as inconfidências de Monsanto, os escritos dos vereadores da Amadora e os relatos da viagem da autarca de Felgueiras. Aliás, a dra. Felgueiras de Felgueiras, pessoa de grandes convicções religiosas, até já foi previamente absolvida por uma intervenção do senhor bispo do Porto que, assim, repetiu as teses de um outro bispo, o do Funchal, sobre um Frederico que era padre e também optou pela Copacabana. Digamos apenas que ambos exercitaram o direito natural de cada um poder mexer-se, numa locomoção capaz de os livrar do sol aos quadradinhos.
Só ficamos sem saber quantos outros puderam beneficiar dessas místicas protecções e de outras mais profanas coberturas que impediram a justiça de actuar e que levaram o presente peixe miúdo a ocupar as páginas dos jornais. A propósito, sempre gostaria de saber o que sucederá quando um dos detidos preventivamente, doutorando em direito penal fiscal numa universidade raiana, se dirigir a uma faculdade dirigida pelo inspirador do actual regime de registos de doutoramento exógenos, exercendo o respectivo direito potestativo...
Voltando ao fio do discurso, direi que dois dos membros de tal trindade, todos ex-ministros da república, com um que o foi de Salazar e outro que o esteve para ser de Marcello Caetano, todos se cocorizam perante o único dos três que foi supremo magistrado da nação e que vai brincando com os outros dois, bem como com mais dois ou três que tentam entrar para o clube dos cimeiros desta pobre pátria.
E, à volta dos três, há uma série de círculos concêntricos de outros operacionais das redes, onde se destacam os "kingmakers", manipuladores da santa cunha e do mais amplo tráfico do colarinho branco, bem como ex-grandes intelectuais à procura de reforma.
Mas porque os grandes bispos deste xadrez não querem sujar as mãos na cozinha doméstica do sacaneamento, tratam de usar os habituais jagunços, mais ou menos, titulados com uma qualquer honraria que os primeiros fabricaram, bem como os burocratas de antanho, especialistas no veto de gaveta, também por eles nomeados.
O micro-autoritarismo destas grandes criaturas gerou assim uma espécie de despotismo doce, em sucessivos círculos institucionais e intestinais, onde a principal culpa vem dos que, optando pela escravidão voluntária, não querem promover a necessária revolta de escravos.
No fundo, todos estes círculos, que conseguiram atravessar, incólumes, o 25 de Abril de 1974, continuam a não passar dos tais grupo de amigos que se odeiam cordialmente, apenas usando da técnica da coligação negativa para assassinatos morais dos que podem desfazer a sórdida teia que vai minguando o país.
Alguns deles, que já super-comandaram a própria PIDE, não se eximem em recorrrer às adjectivações inquisitoriais, antes de procurarem construir epitáfios, usando o método das notas oficiosas do estalinismo e do salazarismo.
Sentindo-se bem mais amplos que a gentalha dos restantes portugueses, quase concebem o país como um instrumento para as respectivas ambições. Odeiam especialmente todos aqueles que os não apoiaram à ascensão ao supremo poder, só porque desconfiavam que eles tinham vindo do outro lado e nos poderiam conduzir para lado nenhum, como se pode demonstrar pelo respectivo curriculum, dado que sempre estiveram no centro de apoio aos sucessivos situacionismos que os foram prebendando.
Basta reparar que, no estreito círculo das duas centenas de notabilidades que nos comandam, permanecem, com outros nomes, as mesmas vinte famílias que nos têm comandado há duzentos anos, onde há tias em vez de padrinhos e avôzinhos em lugar de "capos". Essas almas de inquisidores que assentam numa antropologia de ódios, são os mesmos que agora punem os isaltinos porque eles são de extracção rural, mas depois de os terem salamalequeado, quando eles ainda tinham subsídios, honrarias ou isenções para distribuir.
Alguns de tais psicopatas do poder continuam a pontificar neste reino de estupidocracia, onde muitos persistem em reconhecer a bem poucos o monopólio da inteligência, neste nosso desgraçado país, onde, para utilizar as palavras de Almada Negreiros, ninguém a ninguém admira e todos a determinados idolatram.
Aliás, o crime compensa. Para uns, eis que, do mentir e mentir, alguma coisa fica, enquanto que outros, talvez mais senis, pensam que já é verdade a própria mentira que construíram.
Por isso é que a partidocracia se transformou num sistema oligárquico plebiscitário, dependente das linhas neofeudais do sistema internacional, pelo que manda em Portugal quem melhor pode ser mandado por quem manda no mundo.