Não tenho mestre nenhum

 

Não! Não tenho mestre nenhum 

e sem ismo que me limite, 

para quê definir meu crer, 

comprometer quem sonho 

nas binárias abstracções 

das chamadas ideologias? 

Deixa que os outros se percam

no bulício dos rebanhos

que reduzem o mistério

aos medos que os proíbem. 

Deixam que os outros diluam

seu indiviso divino

na revolta de um comício.

Deixa que a multidão sem nome

se acotovele, solitária,

nas teias de um qualquer rossio.

Eles não sabem noites de Maio, 

prados, valados, praias,

dunas e olhos de mar,

procurando estrelas que não há. 

Eles não sabem navegações, 

corpos de bruma, ritmos de vento. 

Eles não sabem quem somos, 

não sabem até quem são. 

Que há sonhos, sementes, silêncios, 

dias que hão-de ser procura 

do que vem além dos dias.