Neste extremo do Oriente

 

Neste extremo do Oriente, 

na ribeira do Pacífico, 

jaz postado alguém 

que, de si, apenas sabe. 

que, afinal, já nada sabe.

Aqui, onde as cores das coisas 

tão diferentes das minhas são, 

mais doendo vai o mistério

de, em mim, me procurar. 

No profundo transcendente, 

onde temo penetrar, 

nessas penumbras 

que só a imaginação 

consegue desvelar. 

São manhãs cheias de verde e bruma, 

muitas pequenas flores, 

milhentas pétalas de todas as cores. 

Que venham sonhos, lumes, fumo,  

leves folhos que a brisa sobrevoem,  

rosas barcaças que flutuem 

sobre os restos de quem fui. 

Na solidão precária

deste quarto emprestado, 

o rumor surdo e absurdo, 

no burburejar das horas. 

A insónia desta noite tropical, 

um terço do dia mais adiante 

do sítio onde tenho que viver.

E sempre o sabor da náusea,  

da fétida violência,  

feita remorso e doença.  

Quando apetece dar descanso ao sono,  

ter nuvens que me deleitem,  

cavalos que trepem ribanceiras, 

sincréticas cores, 

brandas névoas que diluam 

estes sinais de revolta,   

medo que o sono me traga  

o travo amargo da ruína  

O verde dos montes da China,  

o dlim dlim  

das imensas campainhas,  

e o chlope chlope das águas  

batendo no dorso das praias.  

Que o meu corpo seja barco 

e os remos quebrem

as águas paradas da memória.