Sou apenas a decadência de quem sonho

 

Sou apenas a decadência de quem sonho, 

neste quem fui que pressente 

quem não sou, mas hei-de ser. 

Um pedaço vivo da minha história,

as vagas formas que me dão a bruma

de uma saudade por cumprir,

quando ainda havia ilusão

das palavras serem missão.  

Esse espaço entre o ser e o não-ser

que faz de mim o poder-ser,

onde uma só palavra me prende 

ao que desde sempre me liberta.

Além de mim e do mundo,

aqui e agora, dentro da hora,

pelo sonho, fui voando,

sem sair do que procuro.

Por dentro de mim, 

dentro, bem fundo, 

onde já não sou quem pensa, 

sempre mais além, 

cada vez mais longe. 

Eis meu destino: 

ir e vir dentro de mim, 

palavra a palavra,

o mistério da viagem 

e, peregrinando poemas, 

perseguir meu fim, 

prosseguir dentro de mim 

Sou, mas meu ser não sei. 

Sou, mas não sei quem sou. 

Entre a sombra de quem fui 

e o sonho de quem serei, 

voando além, dentro de mim,

sou quem fui e já não sou, 

quem não sou, mas hei-de ser

e os que, depois de nós, virão. 

Estando aqui, me sinto além, 

de tão fundo, que vou subindo