Leis Eleitorais

A alteração das leis eleitorais foi provocada por um movimento geral europeu nascido a partir de 1848, quando em Fevereiro, em França, se fez uma revolução, dando vivas à reforma eleitoral, pela extensão do sufrágio. Como observa António Cândido, foi a negação do doutrinarismo na política, e uma vivaz reminiscência das esquecidas ideias de Rousseau.

 

Mais de uma década volvida, depois da nossa experiência do cabralismo, que gerou a corrupção, a compra de consciências e a traficância eleitoral, o cinismo político e, considerando-se Napoleão III como o moedeiro falso do sufrágio, surgiram novas ideias defensoras de uma maior participação política, expressas nomeadamente por Proudhon, Littré e John Stuart Mill.

 

Analisando o processo em 1878, António Cândido observava que o sufrágio, universal ou limitado pelo censo ou pela instrução, só é possível numa administração inteiramente descentralizada. Porque for a da mais larga descentralização, é impossível [o  sufrágio universal] como coisa séria, é prejudicial, é ridículo.

O nosso cientista político, invocando Victor Considérant, defendeu assim o modelo proporcional, onde há espaço para todos os partidos, criticando as coligações políticas. Porque eleger não é decidir. A urna, ininteligente e impassível não pode decidir da bondade e da justiça dos partidos; o seu único fim é este: fazê-los representáveis.

Entre 1859 e 1884 dominou o modelo uninominal (lei eleitoral de Fontes/ Barjona), quando surgiram alguns círculos plurinominais, apenas generalizados a partir de 1895 (decreto eleitoral de Hintze/ Franco). 

No entanto, em 1899 (lei eleitoral de José Luciano), voltou-se ao sistema dos círculos uninominais, apenas superados definitivamente pelos plurinominais, a partir de 1901 (decreto eleitoral de Hintze, dito a ignóbil porcaria).

A instituição dos círculos uninominais em 1859 durou até 1884, quando se instituiu um sistema misto, havendo uma progressiva acentuação do modelo plurinominal em 1895 e 1899. Isto é, depois de 28 anos de círculos uninominais, seguiram-se 15 anos do modelo misto, até surgirem 11 anos de predominância do plurinominal.

 

O modelo eleitoral uninominal de 1859, nascido dos históricos, deu vitórias aos mesmos em 1856 e 1858. 

 

O continuado modelo uninominal da reforma eleitoral de 1859, dos regeneradores, também deu vitórias a estes em 1860 (a oposição histórica consegue apenas 7%) e aos históricos em 1861 (a oposição regeneradora chega aos 32%) e 1864 (oposição regeneradora com 30%). Permitiu a fusão de históricos e regeneradores em 1865 e a respectiva vitória eleitoral nesse mesmo ano, mas conduziu, depois, aos resultados de paridade entre estes dois partidos e novas forças em 1868. 

 

A lei eleitoral de 1869 manteve o regime dos pequenos partidos em 1869, 1870 e 1871, até à vitória dos regeneradores em 1874. 

 

Seguiu-se nova lei eleitoral de 1878, com o início do rotativismo, dando vitórias a regeneradores em 1878 e 1881 e a progressistas em 1879 (cerca de 30% para a oposição regeneradora).

 

Em 1884, com o modelo misto, de inspiração regeneradora, tivemos vitórias dos regeneradores em 1884, 1890 e 1892, bem como dos progressistas em 1887 e 1889. Com a predominância dos círculos plurinominais, ainda dentro do sistema misto, pela legislação regeneradora de 1895, surgiu a vitória regeneradora desse ano. Em 1896, vitória dos progressistas. 

 

Com a nova legislação progressista de 1899, nova vitória dos mesmos que, aliás, não impediu a vitória regeneradora no ano seguinte.

 

Finalmente, o modelo plurinominal da legislação de 1901, a dita ignóbil porcaria dos regeneradores, sem franquistas e contra franquistas e republicanos, deu vitórias regeneradoras em 1901, 1904 e 1906, embora dela também beneficiassem os progressistas em 1905 e o acordo entre franquistas e progressistas em 1906.

Isto é, o modelo da lei eleitoral sempre permitiu que o outro partido do sistema vencesse as eleições, dado que importava mais o comando do governo.

 

Saliente-se que a partir de 1893 se entrou num período de desagregação partidária, abandonando-se alguma estabilidade das leis eleitorais.

 

Leis de 1820

Lei de 1822

Legislação de 1826

1832-1834

1836

1838

1842

1847

1851

1852

1856

1859

1870

Lei Eleitoral de 1878 (8 de Maio) Proposta pelo governo de Ávila e aprovada durante o governo regenerador de Fontes.  Seguem-se as eleições de 13 de Novembro de 1878.

Lei eleitoral de 1884 (21 de Maio).  

Lei eleitoral de 28 de Março de 1895

   Lei eleitoral de 1896. O governo regenerador de Hintze propõe, na ratificação do decreto ditatorial de 1895, depois de realizadas as eleições de 17 de Novembro de 1895, uma conciliação com o modelo anterior. Surgem 96 círculos uninominais no continente. Estabelecem-se dois grandes círculos plurinominais em Lisboa e no Porto, agregados às respectivas parcelas rurais. De acordo com este diploma realizam-se as eleições de 2 de Maio de 1897. Deu-se o alargamento da inelegibilidade absoluta a deputado a todos os membros da Câmara dos Pares.

 

Lei eleitoral de 26 de Julho de 1899. 118 círculos uninominais no continente. Círculos plurinominais em Lisboa e no Porto, sem as parcelas rurais, com representação das minorias. Lisboa passa a agregar Cascais e Oeiras. Atribuída missão constituinte às próximas Cortes. Capacidade eleitoral activa para os menores de 21 anos possuidores de qualquer curso de instrução superior ou especial.

Lei eleitoral de 1901 (Decreto de 8 de Agosto, a chamada ignóbil porcaria). Neste contexto, o governo hintzáceo emitiu a lei eleitoral de 8 de Agosto de 1901, onde, para além de se aumentar o número de deputados (para 157) e de se restaurar o processo de representação das minorias que havia sido extinto em 1895 (foram atribuídos 37 deputados às mesmas), criaram-se 26 grandes círculos plurinominais, 4 dos quais nas ilhas. Segundo o relatório do diploma procurava evitar-se a fragmentação dos partidos em clientelas e, com efeito, os influentes locais, a nível de freguesia e de concelho, deixaram de ter o tradicional poder. Por outro lado, os grandes partidos do sistema saíram altamente beneficiados, dado que o resultado eleitoral passou a ser controlado pelo acordo estabelecido entre o partido no governo e o principal partido da oposição. Naturalmente, os outros membros da oposição, percebendo a manobra, logo protestaram, principalmente João Franco que, num dos seus rasgos de baptismo verbal, logo acusou o diploma de ignóbil porcaria, visando o estabelecimento de uma ditadura eleitoral. Na prática, esta teoria funcionou com nova vitória do governo nas eleições de 6 de Outubro de 1901. Uma vitória de tal monta que os próprios franquistas só conseguiram eleger um deputado por Arganil, que não o respectivo líder. Com efeito, face ao desaparecimento da influência dos caciques locais, tudo passou a ser decidido por um acordo central entre a situação e a oposição, atingindo-se assim o nível do rotativismo puro. O partido no governo, com efeito, só não atingiu as maiorias em Aveiro e do Funchal e os próprios republicanos, apesar de aumentarem a votação, não conseguiram ver nenhum deputado eleito (só em 15 de Dezembro é que Afonso Costa apareceu eleito pelo círculo do Dondo, em Angola).

 

1911 

Lei Eleitoral de 1915 (Lei nº 290, de 11 de Janeiro)

 

Emitida durante o governo de Vítor Hugo de Azevedo Coutinho. Não entra em vigor. Sufrágio directo e secreto. Militares no activo sem direito a voto. 163 deputados no total. 146 no continente. 9 nas ilhas. 155 deputados no continente e ilhas. 35 círculos plurinominais no continente e ilhas. 2 círculos uninominais (Angra do Heroísmo e Horta). 8 círculos uninominais no Ultramar. Escrutínio maioritário a uma volta. Para as minorias, 1 deputado em círculos de 2, 3 e 4 deputados; 3 nos de 10.

 

Lei eleitoral de 1915 (Decreto nº 1352, de 24 de Fevereiro)

Emitida pelo governo de Pimenta de Castro. Não entra em vigor. Com efeito, durante o governo de Pimenta de Castro chegou a ser elaborada  nova lei eleitoral, o decreto de 24 de Fevereiro. Os unionista logo falaram em perigo plebiscitário. Sufrágio directo e secreto. Dá direito de voto a oficiais, sargentos e equiparados (art. 3º). Número total de 163 deputados. 37 deputados reservados às minorias. Minorias de 1 em círculos de 3 a 6 deputados; de 2 em círculos de 7 a 10 deputados; de 3 nos de 11. 22 círculos plurinominais no Continente, dos quais 17 coincidem com os distritos. As cidades de Lisboa e do Porto foram anexadas aos círculos limítrofes. Este decreto foi feito ao abrigo da autorização parlamentar de 8 de Agosto de 1914, atendendo a que na actual conjuntura não é possível recorrer para esse efeito aos meios normais, vista a situação do Congresso, as dúvidas suscitadas sobre a sua legalidade, e as perturbações que já tem determinado o seu funcionamento (do preâmbulo). Revoga a lei de 11 de Janeiro de 1915 que reintroduzia o escrutínio de lista incompleta nas cidades de Lisboa e do Porto. Segundo esta última lei, Lisboa era dividida em dois círculos de 10 deputados e Porto passava a constituir um círculo de 10 deputados. Redução para 159 deputados.

 

Lei Eleitoral de 1915 (Lei nº 314 de 1 de Junho).

Emitida depois da queda do governo de Pimenta de Castro. Direito de voto a militares no activo, ao contrário do estabelecido na lei de Julho de 1913 e de acordo com o decreto de Pimenta de Castro. Nova divisão dos círculos eleitorais. Aumento da representação das minorias: 1 em círculos de 3 e de 4 deputados; 2 em círculos de 8. Isto é 44 mandatos minoritários num total de 163 deputados (a proporção na lei de Pimenta de Castro era de 37 para 163)


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