Tradição e Revolução, vol. II

 

1994

Pedro Santana Lopes demite-se de Secretário de Estado da Cultura, ao que parece em conflito com o estilo de austeridade imposto por Cavaco Silva e rigorosamente vigiado pela esposa do primeiro-ministro. Conseguira resistir à demissão de dois dos respectivos sub-secretários, como António Sousa Lara, depois de uma tentativa de não apoio à candidatura de José Saramago a um prémio literário internacional, certamente do conhecimento do respectivo superior governamental, e, depois, Maria José Nogueira Pinto, em conflito com um presidente do Sporting Clube de Portugal, lugar que o demitido secretário de Estado exercerá depois de sair do governo (21 de Dezembro).

1995

Pedro Santana Lopes, além de comentador desportivo na televisão chega a presidente do Sporting Clube de Portugal, antes de mais altos voos.

Fernando Nogueira vence o Congresso do PSD, derrotando José Manuel Durão Barroso por 33 votos. Pedro Santana Lopes fica em terceiro lugar (dias 17 a 19 de Fevereiro). Os dois últimos hão-de ser efectivamente os primeiros e o vencedor há-de sair derrotado. O debate é pobre, sem ideias, mas com muitas tricas de corredores. Nogueira canta a “portugalidade” e o “personalismo social-democrata”, num programático estudantil que quase soa a falsete. Barroso, confuciano, é sinicamente esfíngico, no alto do pedestal de uma imagem de ministro dos estrangeiros de Portugal. Os dois são equilibristas e demonstram que hão-de ser sempre o que a conjuntura neles provocar. A terceira-via de Pedro Santana Lopes não é melhor nas ideias, apesar de magistral no bluff. Entre mil e tal delegados, Nogueira ganha com cerca de três dezenas de votos de diferença. Se Mota Amaral logo reclama os quarenta votos dos delegados açorianos, fica nos ouvidos de todos a tirada do nortenho Luís Filipe Meneses que chama aos não-nogueiristas sulistas, elitistas e liberais, lapso que o faz voltar a casa antes das urnas abrirem. Dizendo em voz alta o que gosta de pensar até repete o maurrasiano em política o que parece, é. Mais uma vez, mil e tal iniciados ditam os partidocratas que em nós todos vão mandar. Desses poucos que falam em nome de todos, nesta democracia assim partidocratizada, onde se misturam certos mais ricos com alguns mais expeditos. A crise de representação passa assim pelo Coliseu, nome de circo, pátio de cantigas, onde todos proclamam, na linha de Cavaco que é preciso mais país, que primeiro está o país e que só depois está o partido. Na prática a teoria tende sempre a ser outra e até o partido vem sempre depois da carreira pessoal.

1997

Eleições autárquicas (14 de Dezembro). Comunistas afastados de várias autarquias. Socialista Fernando Gomes mantém-se no Porto. Em Lisboa, João Soares vence Ferreira do Amaral. PSD conquista as câmaras de Gaia, com Luís Filipe Meneses, e da Figueira da Foz, com Pedro Santana Lopes que, entretanto, abandonara a presidência do Sporting Clube de Portugal.

 

2001

Eleições autárquicas, com vitória do PSD (16 de Dezembro) que passa a comandar 159 câmaras municipais (41%). PS com 113 (37,1%). CDU com 28 (10,6%) e PP com 3 (4%). Pedro Santana Lopes vence em Lisboa contra a candidatura de João Soares. PSD triunfa também no Porto (Rui Rio), Sintra (Fernando Seara), Cascais (António Capucho), Faro (José Vitorino) e Portalegre. PS conquista câmaras aos comunistas em Évora, Loures e Barreiro. Comunistas reconquistam Setúbal ao PS.

 

2004

Toma posse o XVI Governo Constitucional, sob a chefia de Pedro Santana Lopes (17 de Julho). O anterior chefe do governo, José Manuel Durão Barroso aceitou o convite para assumir a presidência da Comissão Europeia. O governo continua a ser sustentado pela coligação PSD/PP. E depois de gémitos imensos, a montanha parlamentar deu luz o ratinho do novo programa governamental, esse conjunto de frases metidas a martelo num texto "copy and paste", que bem podia ser adquirido num desses supermercados das pós-graduações para gente fina. Esse solene nada tanto poderia ser assumido por José Sócrates como ser incluído na próxima colectânea de discursos de Jorge Sampaio e os rapazinhos e as rapariguinhas que, nesta conspiração de avós e netos, por aí circulam com o nome de ministros e ministras, secretárias e secretários de Estado, esse máximo denominador comum da presente união dos interesses sociais, políticos e económicos, são, precisamente, aquilo que o marcelismo gostava de ter sido. Essa direita das chamadas forças vivas, bem representativas do estado de cobardia generalizada a que chegámos. A culpa não está evidentemente em Pedro Santana Lopes ou Paulo Portas. Porque, se eles não existissem, outros teriam que ser inventados, nesta genealogia de fidalgotes que, querendo cumprir a etimologia, são, precisamente, os descendentes de alguns dos principais gestores de influências da presente encruzilhada decadentista da pátria. Estes governantes apenas cantarolam ideias e ideologias. Um dia são liberais, adeptos de agressivo individualismo. Outro, sociais-democratas ou democratas-cristãos, cheios de preocupações sociais, fazendo discursos sobre os velhinhos, os pobrezinhos, os reformadinhos, os aposentadões, os jubilidassímos e outros que tais. Um dia estão à direita, de faca na liga, à maneira de Alberto João. Outro, viram à esquerda, no choradinho "jet set", como os ex-líderes de RGA feitos figurões de Estado. Produzidos pela nossa tradução em calão dos Berlusconi, sabem que o povão está embriagado de fado, futebol e fátima e que, em caso de crise, basta mobilizar um novo João Braga, um novo Eusébio ou um novo Rasputine para que, no baralhar e dar de novo, tudo continue como dantes.

 

 

Biografia do Portal do Governo

                   

Projecto CRiPE- Centro de Estudos em Relações Internacionais, Ciência Política e Estratégia. © José Adelino Maltez. Cópias autorizadas, desde que indicada a origem. Última revisão em: 22-04-2007