Respublica
Repertório Português de Ciência Política
Edição electrónica 2004
Está em crise o modelo de Estado que, de cima para baixo, do soberano
para os súbditos, pretendia construir uma nação. Está em crise o modelo de
construção do político onde se dá o primado do poder sobre a liberdade, o
predomínio do Estado-aparelho-de-poder sobre
o Estado-comunidade, do principe sobre a república. Utilizando as categorias de Maquiavel, diremos que estão
em crise os principados, não estão
em crise as repúblicas. Mas, se
utilizarmos termos paralelos, diremos que estão em crise os soberanos,
mas não estão em crise as nações Está em crise aquele
modelo absolutista do político que continua o processo dos déspotas
esclarecidos, como Luís XIV, Frederico o Grande da Prússia,
Pedro o Grande da Rússia ou o nosso Marquês de Pombal. O modelo que permaneceu
e se reforçou com o Estado jacobino da Revolução Francesa, principalmente de
1792 a 1796, constituindo um dos primeiros modelos de um Estado terrorista que
é continuado por Napoleão, Lenine, Mussolini, Hitler, Estaline, Mao ou Pol
Pot. Esse que tratou de executar adversários pela simples razão de pertencerem
a um grupo diferente, considerado como contra-revolucionário, esse que
reinventou o delito de opinião e que aumentou a massa dos prisioneiros de
consciência; esse que praticou massivamente o genocídio; esse que utilizou
como forma de governar a confiscação e que transformou o cidadão em carne para
canhão. Está em causa o modelo de Estado que tentou praticar a engenharia social para a construção de um homem novo. Está em crise o poder, não
está em crise a liberdade. O poder
nasceu para se discutir, a liberdade para o discutir. Como dizia Hannah Arendt,
enquanto a independência nacional, ou seja, a isenção de dominação
estrangeira, e a soberania do Estado, ou seja, a pretensão de total e ilimitado
poder nas relações externas, estiverem identificadas. Julgamos não estar em crise o modelo de nação-Estado,
isto é, da nação que pretende resistir como polis
ou da nação que pretende autodeterminar-se. Aquele modelo que, em nome do small is beautiful, pretende que, a cada nação,
corresponda um Estado, que o universal possa atingir-se através da diferença.,
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Crise e Estado
Stéphanne Rials considera que o Estado, porque é racionalidade, se confunde
com a própria ideia de crise: de uma maneira estrutural, o Estado é intrínsecamente
crise.. a acracterística do estado que aparece e se desenvolve ao mesmo tempo
que a consciência histórica, é a de gerir as crises de modo dinâmico. E
isto porque na vida do Estado o normal é não haver normalizações de
comportamentos sociais, tal como na história nada se repete e tudo se
transformar num processo que é sempre encadeamento de processos. Considera
assim que o Estado é o lugar onde a sociedade se reflecte, se
mediatiza, se pensa, se torna a instância onde se têm de regular o conjunto das
crises e das tensões da sociedade.