Respublica
Repertório Português de Ciência Política
Edição electrónica 2004
Quental, Antero
de(1842-1891)
Antero
Tarquínio de Quental. Activista da Questão Coimbrã em 1865. Participa nas
Conferências do Casino de 1871. Em Portugal perante a Revolução da Hespanha. Considerações
sobre o Futuro da Política Portuguesa no Ponto de Vista da Democracia
Ibérica, um folheto publicado em
1868, depois de Isabel II ter sido derrubada por Prim, dizia que a nacionalidade
não passava de uma forma passageira e artificial, de um facto do mundo político e como ele transitório e
alterável, que ela não seria o símbolo único, a forma mais perfeita do
sentimento nobre, o amor da Pátria. Propunha então que nas nossas actuais circunstâncias o único acto possível e
lógico de verdadeiro patriotismo seria renegar a
nacionalidade. Para ele as forças mais moças e
inteligentes, os elementos mais generosos da nossa sociedade estão comprimidas,
as asfixiadas por esta forma estreita da velha nacionalidade. Entre uma coisa e
outra é necessário escolher. Ora eu sustento que, entre as realidades eternas da
natureza humana, de um lado e, do outro, a criação artificiosa e antiquada da
política, não há que hesitar. Se não é possível sermos justos, fortes, nobres,
inteligentes senão deixando cair no abismo da história essa coisa a que se
chamou nação portuguesa, caia a nação, mas sejamos aquilo que nos criou a
natureza, sejamos inteligentes, nobres, fortes, justos, sejamos homens, muito
embora deixemos de ser portugueses. Era então
que ele advogava um iberismo espiritual, defensor de uma Espanha, não como uma
nação, mas como um aglomerado de elementos justapostos, mas não fundidos,
integrados numa república democrática e federalista. Neste sentido, as
nacionalidades eram consideradas como coisa velha e caduca, como um obstáculo desgraçado, resto das hostilidades fatais de
séculos bárbaros. Em 1869
ainda advogava que Portugal está na classe dos povos extintos, como a Grécia:
tem ainda habitadores que mantêm uma nacionalidade in nomine; mas esta utopia,
formada sobre os in-fólios dos cronicões, tem de se desmoronar por si mesma. É
triste, mas é verdade. No discurso de
27 de Maio de 1871, integrado nas Conferências Democráticas do Casino
Lisbonense, Causas
da Decadência dos Povos Peninsulares nos Últimos Três Séculos, falava com nostalgia do
tempo medieval, dado que neste o instinto
político de descentralização e federalismo patenteia-se na multiplicidade de
reinos e condados soberanos, em que se divide a Península, como um protesto e
uma vitória dos interesses e energias locais, contra a unidade uniforme,
esmagadora e artificial, acrescentando que esse espírito não é só
independente: é, quanto a época o comportava, singularmente
democrático.Terminava, propondo: oponhamos à monarquia centralizada,
uniforme e impotente, a federação republicana de todos os grupos autonómicos, de
todas as vontades soberanas, alargando e renovando a vida municipal, dando-lhe
um carácter radicalmente democrático, porque só ela é a base e o instrumento
natural de todas as reformas práticas, populares, niveladoras.Refira-se que entre Março e Maio
de 1870 tinha ocorrido a Comuna de Paris e é nesse ambiente que, em Maio, era
editado em Portugal o periódico A
República,
onde, para além de Antero, também pontificava Oliveira Martins. Dois anos
depois, quando surgia a Fraternidade
Operária, aconteciam em Portugal as primeiras greves. Nesse mesmo ano, em
10 de Março, o proselitismo de Antero e de Oliveira Martins, juntamente com o de
José Fontana, emitiam novo jornal militante, O Pensamento Social, ao mesmo tempo que, no Porto, surgia o jornal
católico A
Palavra. Contudo, esta
primeira vaga socialista não vão frutificar num país onde se vive uma certa
euforia capitalista. Basta recordar que no ano de 1873, há uma aparente opulência,
manifestada pela fundação de cerca de dois bancos por mês. No ano seguinte, o
estado financeiro continua a ser admirável, graças à grande circulação de
numerário. Só em 1875 é que podia fundar-se o Partido Operário Socialista, estruturando-se um movimento de pensamento que vai
levar Costa Goodolphim a editar a obra A Associação. Contudo, a ideologia que vai ser predominante em toda essa
geração será o positivismo de Augusto Comte cujas linhas vulgarizadoras, bem
expressas na revista O
Positivismo de
Teófilo Braga (1843-1924) e Júlio de Matos, publicada entre 1878 e 1882, vão
ser fundamentais na conformação do nosso movimento republicano. É também
nesse ano de 1878, quando é eleito papa Leão XIII, que Oliveira Martins começa
a inflectir o seu pensamento em As
Eleições,
depois completado pelo Portugal
Contemporâneo
de 1881, dois anos antes da morte de Karl Marx. Como o próprio Antero vai
considerar em 1887, em carta dirigida a Wilhelm Storck, era um tempo em que
vivia num paganismo intelectual
requintado,
numa religiosidade falsa e só
aparente
que não chegaria à essência das
coisas.
Era um tempo em que lia Proudhon e Michelet, bem como Hegel, a tal singular aliança ... do naturalismo hegeliano e do
humanitarismo radical francês. E
ao mesmo tempo
... conspirava a favor da União Ibérica, que seria feita por meio da República Federal, então representada em
Espanha por Castellar, Pi y Margall e a maioria das Cortes Constituintes. O Iberismo era uma grande ilusão da qual porém só desisti
(como de muitas outras desse tempo) à força de golpes brutais e repetidos da
experiência. Tanto custa a corrigir um certo falso idealismo nas coisas da
sociedade!. Em 1888, em carta dirigida a
Fernando Leal, considera: parece que estamos num período análogo ao da dissolução do
mundo romano, ao qual se deve seguir uma nova Idade Média. Quem sabe o que sairá
dela, quando lhe soar a hora da sua Renascença? E talvez que só então valham e
tenham utilidade de aplicação as doutrinas dos filósofos e publicistas de hoje.
Foi assim que muitas ideias de Aristóteles e dos Estóicos só se vieram a
realizar e a adquirir valor social no século XV e XVII!!.
Bibliografia
(Política):
·Portugal perante a Revolução de Espanha. Considerações sobre o Futuro da
Política Portuguesa no Ponto de Vista da Democracia Ibérica