A anarquia madura
Para os que querem saber como se teoriza a anarquia madura, já chegou a tradução portuguesa do inspirador de algumas das lusitanadas de certos sindicatos da citação mútua. Só é novo aquilo que se esqueceu, mesmo que seja aquilo que se copiou e não se citou. O neofeudalismo e a anarquia ordenada continuam, onde tem razão quem vence, mesmo que esteja fora de direito ("outlaw"). Ministeriais figuras, em pose de Estado, ilustríssimos oposicionistas, todos continuarão a fingir que é verdade a mentira que difundiram. Que há sempre novos e velhos clérigos, activos, hiper-activos, jubilados, aposentados, caquéticos ou de uma jota serôdia, dispostos a entrar na nova ordem decretada. Ai dos vencidos! Não serão subsidiados, nomeados ou indicados. Serão vetados, mesmo que, antes, tenham sido eleitos. Só que a lexívia não apaga as edições anteriores. As bibliotecas guardam-nas. Os arquivos não serão incendiados e a verdade é como o azeite num copo de água, mesmo que o conteúdo saiba ao pantanal em que visceramos.

posted by J. A. | 5:34 PM


Política de Federação Europeia
Apesar de toda a política de segredo de Estado, acabámos de tomar conhecimento de uma missiva do chefe de governo aos nossos agentes junto das chancelarias da Europa. Por isso, vamos imediatamente dar-lhe a forma de "post":

A criação de uma Federação Europeia constitui uma das ideias dominantes da política actual, pelo que os problemas que se levantam à sua volta e as decisões já tomadas, orientadas no mesmo sentido, têm sido objecto de atenta consideração por parte do Governo Português.
Por se tratar de uma questão que continua a manter a maior actualidade, convém marcar a nossa posição em face de tal política.

No fundo, temos apenas duas realidades - uma ideologia americana e uma política francesa. Possibilidades de realização da ideia, ambiente político ou moral, necessidade absoluta da sua execução para solução dos problemas económicos ou políticos europeus - tudo está em muito secundário plano, e no entanto isso seria o essencial a ter em conta.

Quando digo acima uma ideologia americana, devia dizer talvez com maior justeza uma ideia de partido ou de partido governamental.

Quando me refiro a uma política francesa, quero exprimir de facto a adesão, aliás pouco entusiástica, duma fracção dos políticos franceses, porque a França, se anseia por não ter de bater-se, também procura não ser mandada por outros.

Quando aludo ao receio de se perder o auxílio americano, penso que esse receio não tem razão de ser, porque a Europa é tão necessária à América como esta à subsistência da liberdade europeia. E é sobre tão frágeis fundamentos que se anda a construir a federação da Europa.

Que no domínio lógico é possível federar a Europa - é. Simplesmente essa federação só haveria a meu ver duas maneiras de fazê-la com viabilidade - o acto de força de um federador ou uma lenta evolução que pode levar séculos. Se Hitler tem ganho a guerra, era possível que obrigasse a Europa a federar-se sob a hegemonia alemã; e pelos frutos e demoras da evolução não se quer esperar.

O conjunto e as dificuldades dos problemas a resolver por acordo excedem a capacidade dos homens e das negociações entre Estados. Se há um vencedor, esse impõe a vitória e com a força desta pode não resolver, mas corta os problemas. Abandono de terras, arrumação ou concentração de indústrias, deslocação de populações, desequilíbrios económicos, perdas de interesses e capitais - tudo isso ele o imporia, criando um condicionalismo diferente à vida dos povos sujeitos. Mais, talvez muito mais do que isso se viu no decurso e depois da última guerra. São sofrimentos sem conta, alterações profundas nas maneiras de viver e de pensar, mas retoma-se a vida em novas bases, e no futuro, num futuro largo, pode até ser melhor para todos os que então existam.

O que um conquistador faz em nome e pelo direito da força, não podem fazê-lo os políticos, ao menos de pé para a mão, contra interesses relevantes e inconciliáveis e sentimentos muito vivos das populações.

A Europa nasceu de certo modo e o processo da sua formação imprimiu-lhe carácter. A sua diversidade, se por um lado é motivo de fraquezas, verificou-se por outro ser fonte de radiação universal. Há neste conjunto nações de tão antiga independência que o arreigado nacionalismo quase se confunde com o sentimento, com o instinto de propriedade e de uma propriedade não transmissível. Nestas circunstâncias é duvidoso que se possa constituir por combinações ou tratados um Estado europeu. Ou melhor: podem os governos acordá-lo, mas os povos dificilmente se ajustarão a ele.

Este ponto é muito importante, porque, desejando-se a federação para aumentar e reforçar a capacidade de defesa europeia, não pode perder-se de vista que esse Estado europeu deverá ser por muito tempo destituído de verdadeira coesão e de força colectiva.


Para evitar confusões, importa descansar o Doutor Ernâni Lopes: o papel foi emitido em 19 de Março de 1953. Falando mais seriamente, importa assinalar que hoje foram emitidos violentos artigos contra a Constituição Valéria, onde, para além do que publiquei, importa destacar o de Jorge Bacelar Gouveia no "Euronotícias", dias depois de Paulo Ferreira da Cunha ter atirado a sua lança no "Jornal de Notícias". Daqui a uns meses, alguns dos mais indignados de hoje, irão, naturalmente seguir os ditames do "rolo compressor" e acusar os europeístas que estão contra esta versão do europeísmo oficialista, de "traidores à pátria, à Europa, à civilização".
 

posted by J. A. | 5:04 PM