Sexta-feira, Junho 13, 2003

Uma história da Patagónia....
Não resisto a contar uma pequena história que se passou recentemente numa universidade bem próxima da Patagónia e de que só hoje tive conhecimento, por andar na “blogosfera” há menos de um mês, por não conhecer todas as sumidades papais que por aqui imperam, e por demorar a teclar os “links”. Com efeito, um jovem aprendiz de assistente-estagiário, talvez por não gostar das barbas brancas de um velho professor da respectiva escola, talvez por ter tido algum complexo freudiano num anterior exame, talvez por ser tão profundo no conhecimento das causas e na emissão dos juízos com que dá notas, decidiu declarar que, na escola dele, se convidavam professores catedráticos a partir de uma pandilha marcada pela desonestidade intelectual, com falta de etiqueta, que alinharia com grupos de idiotas, corruptos, fontes anónimas, e que, além disso, fariam conspirações em sótãos, guerrilhas internas, bocas nos jornais, sempre dispostos a fazer revanchismo saloio. Mais acrescentou o dito assistente estagiário que o dito professor catedrático, tal como outro professor catedrático da mesma terra e da mesma área, não passaria de um intelectual desocupado e esgroviado, membro de uma maralha que não tem ideias, que é uma luminária, que tem com grossas teses de doutoramento, com citações freneticamente cosidas, dotado de uma pose minoritária que julga que da minoria (da minoria ínfima) é que vem a razão. Que o mesmo seria membro de um pântano, dotado de uma coragem da boca para fora, que produziria um pateta discurso de ressentimento social, de descamisados da treta, remetendo para as ideologias que todos bem conheceriam. Aliás o dito estagiário também disse conhecer os retratos que o mesmo professor tinha em casa, bem como dos líderes estrangeiros que o mesmo veneraria, sabendo que ele faria parte de uma pseudo-vanguarda ignóbil, casca-grossa, que representaria tudo o que de pior tem o mundo.

 

 

 

Contributo para a teoria dos "blogues"
O velho professor em causa, que me mostrou documentos fiéis, onde isto se prova, reparou como, na Patagónia, era arriscado ter sentido de humor e parodiar um texto sem atentar na catedrática prosápia do assistente-estagiário que o emitiu. O professor em causa confessou-me que tem agora receio de tomar café no bar da referida escola, porque o assistente-estagiário anda a clamar por todo o lado que o velho lhe quer bater, quando o velho nem sequer conhecia tal génio e está disposto a trocar com ele de gabinete e de estatuto, para além de ter intenções, naturalmente, de invocar a constitucional objecção de consciência, para os devidos efeitos, coisa que é o preciso inverso da suspeição. O velho professor perguntou-me se em Portugal ainda haveria sentido de escola e essa estúpida definição de regras de direito não escrito. Anda extremamente triste por chegar à conclusão que foram em vão cerca de três décadas de vida escolar, mas espera que o assistente-estagiário atinja depressa o alto da carreira para poder, de vez, salvar a Argentina de descamisados. Para bom entendedor, estas muitas palavras bastam. E a teorização de José Pacheco Pereira sobre os “blogues”, terá aqui mais um “case study”.

 


 

A nova inquisição, entre o canino e o camélico
O velho professor mostrou-me também um texto que, há uns anos, escreveu em defesa de dois catedráticos da sua escola, humilhados pelo mesmo semanário onde o mesmo assistente-estagiário é estrela: "o nihilismo inquisitorial, adepto da terra queimada pela intriga, instrumentalizando a liberdade de expressão e, sobretudo, a liberdade de imprensa, não pode ser compensado pelo rigor da protecção coactiva de uma qualquer lei, nem pelos meios de defesa do poder judicial. Para além do direito, há a moral, aquele valer a pena estar de acordo consigo mesmo, mesmo que pareça estar-se em desacordo com todos os outros.
O velho provérbio de que os cães ladram, mas a caravana passa, não é reconfortante e pode não ser verdade, porque implica deserto, caravana, camelos e cães disponíveis para ladrar. Há quem não ande em caravanas, há sítios que não gostam de ser deserto e há os cães que obedecem sempre à voz do dono ou daqueles que os assanham. Talvez não valha a pena termos de escolher, do mal, o menos, isto é, entre o canino e o camélico, quando se prefere a terra dos homens, quando apetece caminhar e há tanto que fazer neste nosso tempo que já não é de vésperas, mas de insensível caminhada para um vazio de poder cultural, para onde correm lestos os iconoclastas dos novos camartelos colonizadores".

 

posted by J. A. | 7:58 PM